Em meio à pandemia, modelos e influencers virtuais ganham espaço na moda

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Desde 2016, personagens virtuais como Noonoouri são recorrentes na moda. Criadas por designers gráficos, essas figuras têm faturado milhares de seguidores, contratos com agências de modelos internacionais e parcerias com algumas das principais grifes do mercado de luxo. O número de trabalhos dedicados aos avatares renderizados já crescia consideravelmente antes de pandemia, porém, o distanciamento social acabou acelerando a disseminação da computação gráfica na indústria têxtil. Nas últimas semanas, etiquetas apostaram na ferramenta para divulgar as novidades das temporadas resort 2020 e primavera/verão 2021, utilizando-a para substituir modelos em ensaios e desfiles. Poderiam as máquinas ocupar o lugar das profissionais de carne e osso? As medidas impostas para deter o avanço da Covid-19 pelo mundo impossibilitaram o desenvolvimento de desfiles, campanhas e ações publicitárias. As temporadas resort e primavera/verão, que começam a ser planejadas em março, acabaram sendo impactadas diretamente pelo isolamento. Sem qualquer certeza sobre quando seria possível retomar as atividades de marketing tradicionais no mundo da moda, muitas etiquetas apostaram nos ensaios a distância e há, até, quem tenha envolvido a avó na divulgação de novos produtos. Porém, para um visionário time de diretores criativos, o momento abriu espaço para uma tecnologia que já ganhava força na indústria têxtil.

A computação gráfica, usada para dar vida às comentadas influenciadoras, modelos e roupas virtuais, se mostrou uma boa solução para os percalços provocados pela pandemia. Se no mundo real as profissionais da moda estavam ilhadas em casa, no universo on-line as máquinas estavam prontas para preencher as lacunas deixadas pelo distanciamento.

Computação gráfica nas semanas de moda

Em 1998, o designer Helmut Lang experimentou trocar um de seus comentados desfiles por um lançamento via CD-ROM. Em vez de receber convidados em torno de uma passarela, o austríaco mostrou as novidades da temporada em um show previamente gravado.

“O grande experimento não foi isento de desvantagens, mas aponta o caminho para o futuro, em uma indústria global que busca alternativas aos desfiles. É estranho que em um setor no qual há mudanças a cada estação o método de apresentação seja o mesmo há quase 50 anos”, escreveu Constance White, no New York Times, à época. Mais de 20 anos depois, a persistência do mercado no tradicional formato continuava a mesma, sem grandes atualizações e reformulações significativas. Porém, o novo coronavírus obrigou as semanas de moda e as grifes de luxo a se adequarem à realidade do isolamento social.

Com a propagação da Covid-19, os eventos dedicados ao menswear e à alta-costura, que normalmente acontecem entre junho e julho, chegaram a ser cancelados. No entanto, após especialistas começarem a questionar a capacidade de reinvenção das semanas de moda, com grifes de grande importância ameaçando abandonar as plataformas, as organizações responsáveis pelas fashion weeks deram o braço a torcer, investindo em soluções digitais.

A chegada da pandemia obrigou as grifes do universo fashion a se adaptar ao distanciamento social

As marcas envolvidas nos tradicionais eventos de moda adequaram seus lançamentos aos mais diversos tipos de formatos, entre curta-metragens, desfiles pré-gravados e ensaios. Porém, para algumas etiquetas, a melhor solução foi recorrer à computação gráfica. Entre as atrações da primeira edição on-line da semana de moda de Londres, o designer de acessórios Stephen Jones Millinery investiu em um vídeo estrelado pela boneca virtual Noonoouri. Graças à ideia, sua mais recente coleção de chapéus ganhou a atenção dos mais de 360 mil seguidores da personagem, como Marc Jacobs, Naomi Campbell, Maria Grazia Chiuri e Kim Kardashian.

Desenvolvida pelo designer alemão Joerg Zuber, o avatar renderizado já havia garantido algumas parcerias com as etiquetas Tommy Hilfiger, Hugo Boss, Valentino, Prada e Gucci, tornando-se parte do casting da IMG Models. Todavia, durante a pandeia, a modelo virtual expandiu ainda mais seu currículo, protagonizando trabalhos para L’Officiel, MSGM, Lacoste, Vogue, Elle, Versace, Mugler e Viktor & Rolf. A label francesa, inclusive, selecionou a influenciadora virtual para mostrar uma das criações da casa durante a semana de alta-costura digital.

Na Milão Fashion Week on-line, que recebeu o retorno dos desfiles físicos por meio das apresentações da Etro e Dolce & Gabbana, as grifes Han Kjøbenhavn e Sunnei também se destacaram por inovar as exibições de moda com animações tridimensionais. Ambas as marcas utilizaram avatares animados para revelar as apostas para a primavera/verão 2021.

 

Acima, link do instagram de Eugene Lee Yang , Influencer digital.

Personagens virtuais x Modelos

Mara não é a primeira modelo virtual do Brasil, tampouco do mundo. Desde 2016, nomes como Lil Miquela, Noonoouri e Shudu entregam dados de relevância aos departamentos de marketing do mercado fashion, arrebatando trabalhos antes dedicados apenas às top models. Vale destacar que as figuras tridimensionais podem estar em qualquer lugar, a qualquer hora. Segundo a HypeAuditor, influenciadores virtuais são “personalidades on-line construídas por imagens de computação gráfica e controladas por marcas ou agências de mídia”. Em um recente relatório, a empresa que analisa tendências das redes sociais identificou que essas figuras tiveram quase três vezes mais engajamento que os profissionais reais nos últimos anos. O Brasil é responsável por 9% dessa audiência, perdendo apenas para os Estados Unidos (23%). “Conforme os profissionais se tornam menos necessários para que o cliente conte sua história, começaremos a notar mudanças sísmicas enormes”, previu Doreen Small, sócio da Davis Shapiro Lewit Grabel & Leven, à Elle. Alexis Ohanian, cofundador do Reddit, recentemente comparou as celebridades do mundo virtual as do mundo real. “É possível afirmar que a foto de uma pessoa de carne e osso, alterada por meio de filtros, softwares ou aplicativos de tratamento de imagens, é real? As mídias sociais têm sido dominadas por seres humanos reais sendo falsos”, comentou ao Wall Street Journal. Ainda assim, o negócio da influência virtual ainda não movimenta tanto dinheiro em território nacional. Enquanto algumas estrelas das redes sociais faturam até R$ 500 mil por mês no mercado nacional, Vic Kalli, a primeira influenciadora 100% digital brasileira, ainda não chegou a 17 mil seguidores. No entanto, para o especialista Arthur Igreja, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), “é mera questão de tempo” até a tendência se instalar por aqui. De acordo com ele, o fenômeno dos avatares tridimensionais é uma das apostas do livro The Non-Obvious Trends (“tendências não-óbvias”, em tradução livre), do renomado marqueteiro Rohit Bhargava.

Na visão do professor, uma das principais vantagens dos influenciadores virtuais em relação aos “reais” é não ter limitações linguísticas. A partir dos softwares que transformam dados em imagens e vídeos, eles podem dominar todos os idiomas, além contagiar os seguidores com emoções fabricadas. Isso porque os humanos são neurologicamente predispostos a sentir empatia por robôs e personagens de computação gráfica.

É possível que a computação gráfica roube o espaço das modelos? Sara Ziff, fundadora e diretora executiva da Model Alliance, acredita que não. “Sempre haverá um interesse nos seres humanos, em suas vidas e na evolução de suas carreiras, mas, de qualquer forma, as meninas estão de olho na movimentação”, contou à Elle. A executiva entregou que muitas profissionais estão preocupadas com o padrão de corpo perfeito que esses avatares podem gerar, mas revelou que outras já pensam em se disponibilizar para digitalização, com o objetivo de fechar trabalhos não presenciais. “Algumas levantaram preocupações sobre as verificações tridimensionais do corpo, que podem ser alteradas no computador. Também há uma preocupação legítima a respeito da liberações de imagem. As pessoas podem ser aproveitadas sem saber e isso logo pode afetar a indústria”, sugeriu. Não sabemos onde os personagens da computação gráfica irão chegar, mas é evidente que eles estão ocupando cada vez mais espaço no mundo da moda. Conforme a resolução das telas e visores evolui, as possibilidades em torno dessas tecnologias tridimensionais só crescem, principalmente em cenários de instabilidades políticas, econômicas e de bem-estar.

As ferramentas podem representar um porto seguro para os departamentos de marketing nos próximos anos. Contudo, as modelos e suas personalidades reais e marcantes devem se manter no coração do público, sempre apegado às histórias de superação. Há espaço para todos.

Fonte: Metrópoles

 

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